kalmia latifolia - a286 lyrics
[verso 1]
agora não há mais o que fazer
definitivamente acabou
a esperança de um dia mudar e voltar a ser
como quando tudo começou
quem vai entender meus motivos?
o por quê guardei tudo pra mim?
como sustentaria meu filho?
a maquiagem esconde e os cortes
nem foi tão fundo -ssim
pra quem vê de fora é fácil condenar:
“era só separar”
sem o pai dos seus filhos, doente e possessivo
ameaçando te matar e se matar
descrevendo seus p-ssos, sua roupa
e seus atos em mensagem por celular
cego, obcecado, fantasiando caso
te perseguindo e vigiando trabalhar
e você dividida
refém, entre a paixão e o rancor
uma vida de foragida ou resgatar a família
que tanto sonhou e sempre amou?
pra quem vê de fora é fácil, eu sei
também cansei de julgar
na equívoca convicção: “só acontece com os outros”
sem nunca se pôr no lugar
só acontece com os outros mesmo
mas agora os outros é você
no deserto do lar sob chuva de soco
sem sucesso tentando se proteger
“essa foi a última vez
vou fugir e denuncio o covarde”
desde o primeiro murro que minto pra mim:
“agora acabou de verdade”
até a cena de praxe das lágrimas
convincente em sua declarações
e eu como sempre vencida pelo presente
uma rosa e um bilhete com mil perdões
pra nem uma semana depois
ver a metamorfose das frases
e as declarações vir em sequência
de bica, paulada e o afundamento da face
me perdoa, mãe
omiti pra te não ver chorar
das mentiras às contradições
só tiveram a intenção de te poupar
não precisa esperar eu pra dormir
descobri que o amor também mata
hoje o romeu não trouxe flor
e eu não volto pra casa
[verso 2 – saída]
da religião à cultura esportiva
da educação à p-rnografia
a conduta não se justifica ao que aprende
mas ao que ensina
o ambiente constrói hábitos
que aparentam autorizar tal comportamento
contribuindo com a ação abusiva
que a alma traumatiza e causa sangramento
a não submissão à tortura, aos maus tratos
da porta pra dentro
ainda é um sonho não sonhado
a razão não tem gênero, mas em diversos lares
da nossa sociedade evoluída
ainda se preserva o único direito:
apanhar em silêncio
com incontáveis hematomas no corpo
impossibilitando trabalhar
sem coragem de se olhar no espelho
nem de denunciar
sem desculpa dessa vez
a saída foi o total confinamento
já que o olho roxo semana p-ssada
já foi a que escorregou lavando o banheiro
é o moderno romantismo medieval
que só entende
quem não entende o que te prende
à essa dependência sentimental
se questionando incansavelmente
por quê tem que ser -ssim?
e quanto mais se despreza
mais sente falta e mais nojo sente de si
estrelando a contraditória
epopeia das pétalas esquecidas
que traz como protagonista do cuspe na cara
ao mesmo que te proporcionou
os melh0r-s dias de vida
a expressão angelical
sem aparente sinal vital
descreve a eficiência da justiça
com um projétil na nuca, trazendo na bolsa
a folha da medida protetiva
avisa o oficial
que já não há mais o que depor, na moral
que nossas leis representam
um avanço significativo
só no campo conceitual
que aqui os números -ssustam a opinião pública
mas não estimulam ação
comprovando que o problema é cultural
não de legislação
e a incógnita que desafia a psiquiatria continua sem resposta…
hoje não precisa esperar ela pra dormir
só não esquece o caixão cor de rosa
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